sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A DEPRESSÃO

            A depressão seria uma doença que gera insônia e atormentado estado de inquietude, sem esperança de melhoria? Seria um sentimento de culpa (ou de inferioridade) entendido como uma tensão entre o ego e o ideal do ego, em oscilação do estado de ânimo de forma cíclica oriunda de traumas mentais?

Seria decorrente de perda do objeto ou em decorrência da retirada da libido do objeto ou identificação com um objeto rejeitado? Seria inibição e temor quanto ao futuro, numa procura do alívio do tormento? Seria fadiga e atormentamento por sensações subjetivas? Seria confusão, inibição, problema físico? E quanto ao fracasso, abandono, hostilidade, violência e enérgica repressão sexual, denotam alguma atenção, atração ou associação de imagem de desprezo e negligência?

Seria mero afeto ligado a trauma preservado na memória? Seria suposição de cena primária estabelecida como alucinação?Pessoas equilibradas, sem problemas nervosos podem apresentar quadro depressivo? E quanto ao desejo das grávidas de matarem os filhos? Inteligência, ética, normalidade, caráter, sonhos, ideais, impressão, compreensão, confiança  e estilos de vida envolvem capacidade curativa para o problema da depressão? E quanto à rápida alternância entre alegria e tristeza? Seria insanidade, perturbação, mudança de ânimo? E quanto à emoção dolorosa de cuidar de pessoas doentes, haveria transferência de depressão?

Inicialmente, abordamos o fato de que a depressão pode ser descrita como o que está sendo escrito na vida do paciente de forma profunda. O ataque de angústia ou de melancolia sempre tem uma conexão aparentemente racional com um trauma psíquico, principalmente se relacionado ao tormento e perplexidade decorrente da morte de alguém querido.

Tanto o medo, a cólera, a dor e o deleite sexual, bem como o desgosto, a preocupação e a tristeza, abatem a nutrição do corpo sendo relacionados com os estados afetivos persistentes de natureza penosa que também estão relacionados com os mecanismos mentais de repressão, sublimação, introjeção e projeção, e com os dois sistemas mentais da consciência e o inconsciente.

Analisando de forma mais profunda essa neurose de luto, a explicação mais profunda sobre essa questão a nível inconsciente, decorre do fato de que há uma ambivalência sobre o que se considera bom demais para ser verdade, numa tentativa de repelir uma parte da realidade que gera desprazer e ao mesmo tempo gera um prazer numa auto-punição, aonde o sofredor não se permite a felicidade porque espera que algo de bom aconteça pelo mero Destino ou ocorrência do acaso.

Essa culpa ou inferioridade de achar que não merece ser feliz materializa na consciência um severo superego que desrealiza e despersonifica a existência real dos fatos e que ao mesmo tempo sobrecarrega e incapacita a pessoa que se fecha dentro de si mesma e se transforma num tormento para as outras pessoas mais próximas, principalmente aos cuidadores de pacientes depressivos e familiares mais próximos.

Tanto o nervosismo como a diminuição da auto-confiança estão relacionados ao individualismo patológico que impõe idéias antiéticas (que produzem pessimismo e fobias), subtraindo e enfraquecendo a vontade, inibindo a consciência, estabelecendo uma contra-vontade no sujeito, que nos casos mais graves pode tornar impotente qualquer forma de interação.

Na ação do mecanismo psíquico, quando a vontade e a conduta são afetadas pela incapacidade opressora, se estabelece a inibição e a fixação de uma apatia como a sintomatologia de uma degeneração da assimilação transferencial, gerando esgotamento da satisfação.

A auto-censura reforça o estabelecimento de um sentimento de  vergonha paranóica que gera afastamento pela suposição de que todos os envolvidos estariam desprezando o(a) paciente depressivo(a), não sentido falta dele(a).

As representações aflitivas que parecem ameaçar a felicidade ou a auto-estima do indivíduo, ocasionando desvios do objeto do pensamento envolvem também, a derivação do superego desde as primitivas relações objetais infantis, bem como a relação entre as divisões da mente e as duas classes de instintos, e as inter-relações entre as próprias divisões da mente, com referência especial ao sentimento de culpa.

O conteúdo censurado denota que as interpretações errôneas da depressão paranóica se baseiam num recalcamento, aonde o ego alterado opera a fraqueza de memória numa neurose obsessiva com alucinação delirante, provocando conflito de auto-recriminação, culpa, retração regressiva da libido, situações de desconsideração, desprezo ou desapontamento.

Esses sintomas podem trazer para a relação entre o(a) depressivo(a) e outras pessoas, sentimentos opostos de amor e ódio, ou reforçar a ambivalência já existente entre o que já foi citado acima, entre o que gera desprazer e ao mesmo tempo gera um prazer numa auto-punição.

Numa questão narcísica, no(a) deprimido(a), o amor pelo objeto que não pode ser renunciado e a rejeição ao próprio objeto faz com que o ódio entre no objeto substitutivo, abusando, degradando, fazendo sofrer, tirando satisfação sádica do sofrimento, numa auto-tortura agradável, assim sendo, pela autopunição, a vingança ao objeto original que não lhe retorna o amor cedido e não correspondido gera a tortura ao ente amado através da sua doença, à fim de não expressar abertamente a hostilidade pela falta da transferência requerida.

Essa catexia erótica ambivalente do conflito da opressão relaciona o sadismo à tendência de suicídio, levando-nos a entender que o ego só pode se matar se, devido ao retorno da catexia objetal, puder tratar a si mesmo como um objeto — se for capaz de dirigir contra si mesmo a hostilidade relacionada a um objeto não correspondido, onde a ferida aberta atrai todo tipo de energia negativa ou pensamentos pessimistas até o esvaziamento e empobrecimento do ego.

A insônia e o tédio atestam a rigidez dessa condição, como a impossibilidade de se efetuar o retraimento geral das catexias necessárias ao sono, bem como a embriaguez, aonde as toxinas suspendem as energias repressivas, num falso deleite de desinibição.

Além disso, a liberação do objeto que causou o sofrimento gera a procura por novas catexias objetais, aonde a ausência dos pais na infância provoca insatisfação e aspectos patológicos no caráter, na relação afetiva, aonde atividade e interesses são perturbados pelas mudanças de ânimo circunstanciais.

Temores, auto-incriminações infantis e alternâncias de sintomas podem estar relacionadas a lutas contra hábitos sexuais, como casos amorosos ocasionais, que geram tormentos mentais na própria natureza inconsciente das tendências criminosas envolvendo sintomas orgânicos e psicológicos como alteração de humor.

As interconexões entre incorporação, identificação, a formação de um ideal do ego, o sentimento de culpa e os estados patológicos de depressão ainda são assuntos carregados de preconceito porque na irrupção da angústia ligada a fantasias sexuais recalcadas e na transformação da libido que pode culminar em angústia, existe uma tentativa de descrever os estados de depressão em termos puramente neurológicos querendo substituir a abordagem psicológica que denota entusiasmo e dificuldade no tratamento por causa da estrutura psíquica estratificada.

Fé, proibição, inocência, santidade, liberdade de obter prazer e abstinência estão profundamente relacionados ao erotismo anal primitivo que persiste na vida erótica posterior, numa idéia simbólica de antecipação da descarga por sinais apropriados de emoção, palavras ou ações, aonde a incapacidade, inibição e preocupação estão fortemente vinculadas a expectativas, pretensões e desejos de continuidade que, quando estão ligados à insegurança, restrições pessoais e más-influências geradoras de crises.

Sintomas graves que envolvem as descargas de estímulos ou reações afetivas exageradas ou restrições das funções do ego impostas como medida de precaução (como excitações que conflitam com pureza moral) ou acarretadas como resultado de um empobrecimento de energia são sinais da transformação do afeto e do desprazer, traduzidos como ansiedade, podendo produzir intenções autodestrutivas como insociabilidade histérica e um taedium vitae.

Ainda, segundo Freud, a elucidação da situação de depressão surgiu do judaísmo, quando Saulo de Tarso afirmou que “a razão por que somos tão infelizes é que matamos Deus, o pai”, o que Freud compreende como uma vontade das pessoas de “estarem libertas de toda culpa, uma vez que uma pessoa sacrificou a vida para absolver a todos”, aonde o sentimento de ser escolhido foi substituído pelo sentimento liberador da redenção, aonde o pecado sem conhecimento e sem intenção também gera depressão.

O analista, assim, procede como um arqueólogo, procurando extrair as inferências a partir dos fragmentos de lembranças, das associações e do comportamento do sujeito da análise, visando reconstruir por meio da suplementação e da combinação dos restos que sobreviveram para entender a depressão segundo o histórico de vida do(a) paciente, na busca do inconsciente.

Para a supressão deliberada da depressão, o desejo que surge da convicção interna envolvendo utilidade, possibilidade e realização deve concordar com a razão do aprendizado gerando motivação da busca pela esperança que podem gerar a obtenção do que se deseja, ainda que de forma penosa e resistente, aonde a transferência interpessoal pode ser de grande ajuda; no final, a coisa decisiva que permanece é a mudança envolvendo os fatos biológicos e o grande enigma subjetivo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário