terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

O PAGAMENTO NA TERAPIA

Pagar as despesas de uma terapia dá direito a reembolso? O que se passa pela mente do paciente quanto ao fato de que não existe devolução quanto ao pagamento das sessões?

O dinheiro representa a valorização do acontecido; a fantasia que se realiza como familiarização do procedimento e o combate da sanção surgida como juramento, aonde o desejo de reembolso é uma manobra ou tentativa do paciente para impedir que as dificuldades surgidas pelo sofrimento sejam descobertas, o que conceituamos como resistências do inconsciente.

O não pagamento ao analista representa o desejo do paciente em ter alívio por satisfazer-se na recusa de aceitar as declarações deste, quanto à responsabilidade do mesmo, o que denota a própria incapacidade do paciente de entender a necessidade de continuar o tratamento, seja por falsas premissas ou pela curiosidade de querer interromper suas contradições confusas.

Há pacientes que simplesmente se esquecem de pagar o tratamento, ainda que numa relação terapêutica bem definida e bem expressa em termos de evolução do quadro clínico. A grande indagação é saber o que o pagamento representa à pessoa que por recomendação tem conseguido pensar em saúde mental e emocional.

Para o analista, o pagamento do paciente envolve a auto-preservação e desejo de obtenção de poder deste, aonde cabe ao analista detectar o poder dos fatores sexuais que se acham envolvidos na questão da valorização atribuída pelo paciente ao dinheiro como pagamento ao profissional que o acompanha.

O profissional não deve ser incoerente nem hipócrita; não pode ter vergonha de dizer que o preço avalia seu tempo como profissional, aonde não deve haver acumulação de dinheiro por espaço de tempo longo para que não haja uma descarga de excitação de forma intensa na relação terapêutica, desgastando-a.

O profissional deve ser franco por ter à sua disposição métodos de tratamento que podem ser úteis, devendo reconhecer seus próprios direitos e necessidades reais, ainda que haja quem desempenhe o papel do filantropo desinteressado com esta realidade.

O analista não deve ficar com pena de si, sentindo-se secretamente prejudicado, nem deve queixar-se em alta voz da falta da consideração e do desejo de exploração evidenciado pelos pacientes, sabendo que estando privado da capacidade de ganho, isso seria comparável ao prejuízo infligido por uma incapacitação em atender de forma satisfatória o seu paciente.

O tratamento gratuito aumenta enormemente algumas das resistências do neurótico, levando à tentação inerente na relação transferencial, ou seja pela oposição à obrigação de se sentir grato, oriunda do complexo paterno e que apresenta um dos mais perturbadores obstáculos à aceitação de auxílio psicológico.

Há pacientes que esperam ansiosos pelo momento do pagamento, dedicando a esse momento, um afeto como sendo quase de adoração, bem como, há outros pacientes que, vêem como implicância repetitiva carente de alguma verdade.

O pagamento revela de imediato sua ligação com as idéias, gerando uma introdução participativa ou uma interrupção no diálogo durante o serviço prestado; seja como for, em ambos os casos, o princípio ativo da natureza corrente ativa envolvendo esse assunto é a revelação perceptiva comum nestas duas naturezas de situações conflitantes, aonde a impressão irrelevante do pagar, está ligada a acontecimentos psiquicamente significativos por abundantes conexões associativas.

O próprio paciente responsável pelo lapso deve descobrir a solução; pode despir-se de seus preconceitos e interromper o tratamento, podendo se colocar num estado de resistência e mal-estar, tendo que empreender sozinho uma busca sistemática aonde a agitação será cada vez maior, sem êxito.

Ademais, pode reconhecer o seu  ‘extravio’ como um ato sintomático, ainda que feito intencionalmente, precisando acordar para poder prosseguir na busca com o auxílio de uma imparcialidade profissional necessária, pois é provável que o paciente esteja apenas demonstrando um de seus sintomas: a freqüência com que suas intenções são perturbadas pela interferência de motivos obscuros.

Ainda que a omissão seja tida como inofensiva, pelo conhecimento entre paciente e analista, esse descuido não deixa de se relacionar com os sinais de um comportamento dividido no que concerne ao dinheiro, como a avidez primitiva do lactente, que quer apossar-se de tudo para levá-los à boca, buscando superação.

O desfalque ao pagamento pelo paciente, custeia uma luta interna, aonde o mesmo, ciente da impropriedade de sua ação, deseja superar seu remorso dizendo a si que, na verdade, não tinha nenhum valor o tratamento,  contestando suas auto-recriminações que voltam a surgir, após breve intervalo, como angústia.

O significado dessa insinceridade e negação implícita financeira é uma expressão combinada de descontentamento, de desconfiança e de conhecimento superior, numa alusão de desnecessidade, como se tudo não tivesse passado de uma brincadeira.

Nessa transferência, quando o paciente desempenha o papel de mau pagador com relação ao analista, a transferência desse delírio de mau comportamento, revela uma confusão, aonde o paciente pensa que o analista está tirando algum proveito dele, como que, gastando seu tempo para o tratamento durar mais tempo.

Há quem diga, por receio, que esse tipo de comentário não deva ser exposto; contudo, como a questão envolve o respeito profissional, entre a procura, confissão e o caráter detalhado das despesas envolvendo pagamento do profissional, esse grande e misterioso poder instintivo do dinheiro que se expressa de modo tão impreciso, deve ser esclarecido entre profissional e o paciente, tão logo seja comprovado que a falta da consideração gera um fracasso terapêutivo.

O dinheiro envolve a história da vida da pessoa; de um lado as circunstâncias acidentais e as influências do meio e, do outro lado, as reações conhecidas do indivíduo; baseado em seu conhecimento dos mecanismos psíquicos, o analista deve se propor a estabelecer uma base dinâmica para a sua natureza financeira, fundamentada na intensidade das reações transferenciais, visando desvendar as forças motivadoras originais da mente do paciente, assim como as suas transformações e desenvolvimentos futuros quanto ao andamento da análise.

Temos de reconhecer aqui uma margem de liberdade do paciente, que não pode mais ser resolvida pela psicanálise ou psicologia, que é o desejo de continuidade do trabalho do profissional. O que podemos fazer, é procurar entender a fonte da tendência à repressão e a capacidade para a sublimação nos fundamentos orgânicos do caráter nos pacientes, sobre o quais se vem erigir posteriormente suas estruturas mentais, refletindo nas posturas financeiras, como ganho e lucro ao aprendizado experiencial.

Nisso, aprendemos, a cada atendimento, que sempre existirão razões obscuras inconscientes, dando sentido à nossa própria existência como analistas, visando o bem-comum social, ainda que tenhamos que pagar, em qualquer nível social, um alto e caro preço, recebendo pouco, menos do que a nossa consciência atesta.

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